segunda-feira, 8 de julho de 2013

.:. Pequenos Poemas Em Prosa.:.

XXXV

          .:As Janelas:.

Aquêle que olha,da rua, através de uma janela aberta, jamais vê tantas coisas como quem olha para uma janela fechada. Não existe nada mais profundo, mais misterioso, mais fecundo, mais tenebroso, mais deslumbrante, que uma janela iluminada por uma lamparina. O que se pode ver ao sol nunca é tão interessante como o que acontece por trás de uma vidraça. Naquele cantinho negro ou luminoso a vida palpita, a vida sonha, a vida sofre.                     Para além das ondas de telhados, diviso uma mulher mais madura, enrugada, pobre, sempre debruçada sôbre alguma coisa, e que nunca sai de casa. Pela sua fisionomia, pelas suas vestes, por um gesto seu, por um quase-nada, reconstituí a história dessa mulher, ou antes, sua lenda, que às vezes conto a mim próprio, a chorar. Se fosse um pobre velho, eu lhe teria reconstituído a história com a mesma facilidade. E vou deitar-me, orgulhoso de ter vivido e sofrido em outras criaturas. Haveis de perguntar-me, agora: - "Estás certo de que esta lenda seja a verdadeira?" Que importa o que venha a ser a realidade colocada fora de mim, se ela me ajudou a viver, a sentir o que sou, e o que sou?                                                                                   
Charles Baudelaire
Coleção Rubáiyát
Tradução de Aurélio Buarque de Hollanda



     

2 comentários:

  1. do caralho! a janela fechada é a janela da poesia, à luz da lamparina. grande charlie.

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  2. foda marcelo! mandou o papo, grande charlie.
    .beijo da ludovica.

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